quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Delhi - February 3rd 2009


Fez o que podia. Seria muito que tivesse de volta o direito de seguir a vida? Em outras mãos, o seu destino. Mas ainda assim ela sabia onde encontrar a paz. Pediam-lhe repetitivamente que esperasse. Dias e dias à sombra de uma luz que não despontava nunca. No entanto, de alguma forma misteriosa em meio ao breu de sua jaula ela sabia o que fazer. Só não podia esperar mais. Era preciso que corresse ao alcance do chamado sussurrado dentro de si. E isso ela podia fazer em qualquer lugar menos numa jaula. A condição de obrigação a viver presa numa doença que não lhe pertencia a impedia de encontrar-se. Como então conceber que doença assim alheia pudesse se manifestar nela? Era uma permissão tão íntima que ela concedia ao seu próprio estado de sofrimento que quase não lhe cabia investigar essa dor. Mesmo com isso tudo de esconder-se da verdade que se busca revelar, não era possível que se pacientasse. Além de suas forças, rebelar-se contra o quê?! Se a culpa era do inculpável. Enveredava assim sentimentos de impotência diante do peso de se sentir responsável por sua própria vida. Virei um labirinto infinito, disse virando-se. Tolhida em suas ações e movimentos, a eternidade como promessa de liberação completa ressoava a brisa do tempo perdido. Os relances de pensamentos claros, verdejantes como vales vivos, eram meros toques da sutil natureza poupando que ela morresse definitivamente agora. Pedem-lhe que saiba esperar para que possa fazê-lo quando preciso. A vida como adiamento da morte era incogitável. Igualmente, o adiamento da missão revelada naquele momento luminoso se tornava insuportável. A qualquer tempo ou espaço não se pode ignorar a pulsão do peito a clamar consciência. Quando o coração só se faz ouvir perto, muito perto do desespero e toda a sorte de selvageria das inquietações borbulham a tirar-lhe o centro. A austera sensação de negligência de si mesmo alastrando-se sutil como o calor do sol da manhã. Ela só queria a luz que iluminasse a incompreensão de todo e qualquer ato impensado, in-calculado. Ela não podia mais conter o seu dever de continuar a vida, essa era a questão. Como permitir que lhe tolhessem sem justificativa a liberdade sofrida? Chegava ao limiar de abandonar-se à correnteza de uma nova força... Chegava ao limiar do pensamento de que não precisava mais sofrer... quando algo inesperado acontecia. Era arrebatada de novo à sorte da impermanência das escolhas, da falta de vontade, do medo, da insegurança ou simplesmente de algo qualquer de sabotar o outro naquilo que o faz alguém melhor. Talvez auto-sabotagem. Talvez e provavelmente o que quer que ela trouxesse consigo e despertasse o profundo desejo do outro. Estava na jaula declarado. Oficialmente evidenciada a maldosa infração humana. A desumana droga introjetada de calar e nublar o ser em si do outro. Incontido. Uma vez que ela tivesse sido necessária, estaria descartada. Esquecê-la, então, e comemorar a vitória do um em meio ao todo. Estava só agora. Final e tristemente. Não se permitiria celebrar nada enquanto não fosse livre. E era preciso esperar. Os que lhe nutriam alguma paciência já se tinham ido. Era preciso que lhe habitassem além da memória, então, e só assim... Ela seguiria a vida.